Por: Edivan Costa
08/04/2025
Na madrugada seca do sertão nordestino, o barulho do galo cortava o silêncio como um sino de igreja em dia de festa. Ainda era escuro quando seu Tião, um agricultor de mãos calejadas e olhar fundo, acendeu o fogo do fogão à lenha. O cheiro do café fresco invadia o ar seco da manhã. Ele olhou para o horizonte, ainda cinzento, e suspirou.
Era mais um dia de luta.
Sua neta, Clarice, de apenas 16 anos, se sentou à mesa com o caderno de anotações. Ela havia voltado da cidade há seis meses, depois da morte dos pais num acidente de ônibus. A vida no campo, que antes visitava apenas nas férias, agora era sua única realidade. E por mais difícil que fosse, havia nela um tipo de beleza que só se entendia vivendo.
— Vô, posso te perguntar uma coisa? — disse ela, mexendo no café com cuidado.
— Claro, minha filha.
— Por que o senhor nunca pensou em desistir daqui?
Seu Tião deu um sorriso torto, como quem já sabia que uma boa pergunta vinha com uma história. Foi até o armário, puxou um livro antigo e se sentou na cadeira de balanço. O vento soprava por entre as frestas da casa simples de taipa.
— Já ouviu falar da estória do Tigre e do Macaco?
— A que o macaco engana o tigre? Já sim. Tem no livro da escola.
— Pois então vou te contar uma versão que ninguém conhece. Uma versão… do sertão.
Era uma vez um tigre cansado, sujo de poeira e suor. Mas não era um tigre qualquer — era o apelido de José Antônio, um rapaz forte, valente, mas impaciente. Vivia numa pequena propriedade rural em meio ao semiárido da Bahia, plantando feijão, milho e cuidando de algumas cabeças de gado magro.
Já o Macaco era Chico, um jovem franzino, que dizia conhecer os segredos da roça sem nunca sujar os pés. Vivia dando conselhos, prometendo milagres e dizendo que “sabia das coisas”.
— Tigre, tu tá trabalhando errado. A terra tá morta, esse jeito teu é antigo. Deixa eu te mostrar um esquema melhor — dizia Chico, sempre com um sorriso esperto.
Zé Antônio, exausto e desesperado com a seca que já durava dois anos, ouviu. Seguiu os conselhos do Macaco: vendeu parte do gado, trocou o milho por mamona, acreditou num adubo milagroso e até comprou um trator usado “de leilão”, que deu mais dor de cabeça do que serviço.
Tudo deu errado.
As plantações morreram antes da colheita. O solo ficou ainda mais seco. E o trator quebrou no terceiro dia de uso.
Chico, o Macaco, sumiu do mapa.
Zé, o Tigre, sentou-se no meio da roça vazia e chorou. Pela primeira vez, pensou em largar tudo, vender o que restava e tentar a vida na cidade. Mas ao voltar para casa, viu o velho pai, seu Zé Benedito, regando com balde as poucas mudas de quiabo que resistiam. Naquela hora, sentiu a vergonha apertar o peito.
— Filho, só colhe quem tem coragem de plantar mesmo na seca.
Foi ali que começou a verdadeira virada do Tigre.
Zé Antônio decidiu começar do zero. Estudou o que nunca havia estudado. Buscou ajuda na cooperativa, foi atrás do técnico agrícola da cidade vizinha, aprendeu sobre consórcios de culturas resistentes à seca e métodos de irrigação por gotejamento usando garrafas PET.
Construiu um pequeno sistema de cisternas com as mãos, aproveitando cada gota de chuva. Passou a trocar sementes com vizinhos, reaproveitar restos da produção e cuidar do solo com carinho. A roça ganhou vida. Aos poucos, o verde voltou, mesmo que tímido, e o cheiro de terra molhada após a primeira chuva daquele ano o fez chorar de novo — agora de alegria.
O Tigre havia deixado de ser feroz apenas na força. Aprendeu a ser paciente, astuto e resiliente. Cresceu não pela esperteza dos outros, mas pela humildade em aprender e a coragem de continuar.
Clarice escutava tudo com olhos atentos e coração apertado.
— Mas, vô… e o Macaco?
— Ah, minha neta… o Macaco sempre aparece. Às vezes é uma ideia fácil, uma promessa bonita demais ou um atalho que parece esperto. Mas quem vive no campo sabe: o único milagre que existe aqui é o suor da nossa testa.
Na manhã seguinte, Clarice acordou antes do sol. Pegou o caderno e começou a desenhar o projeto da horta comunitária que queria criar com outras meninas da escola rural. Usaria pneus velhos, caixas de madeira, sementes trocadas entre famílias. O vô Tião sorriu ao ver a neta, antes tão triste, agora suja de terra e cheia de planos.
Meses depois, a horta floresceu. Abóboras, coentro, alface, e sorrisos. Clarice apresentou o projeto numa feira agrícola da região e foi convidada para contar sua experiência em um programa de rádio comunitária.
A estória do Tigre e do Macaco — aquela recontada ao pé do fogão — virou símbolo de superação. O programa rural batizou o quadro de “Contos da Terra”, e Clarice passou a contar, a cada sábado, histórias reais de luta e vitória no sertão. Histórias de gente que não desistiu.
O velho Tião, agora com saúde frágil, ouvia orgulhoso na varanda.
No fim das contas, o sertão não é feito só de seca, mas de gente forte. O Tigre que não desiste aprende a usar a força com sabedoria. O Macaco que engana, desaparece com o tempo. Mas quem permanece é quem trabalha a terra com fé, com os pés no chão e o coração firme.
Clarice aprendeu com o avô que não existem atalhos para um futuro digno, mas há beleza em cada passo firme, mesmo que lento. E em cada história contada, havia uma semente de esperança sendo plantada.
Porque no campo, como na vida, quem cultiva com esforço, colhe com orgulho.
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